Como todas as crianças quis um irmão. Como todos os filhos únicos não o tive.
Enquanto a mães dos meus coleguinhas engravidavam, lembro-me de pedir à minha mãe que fizesse o mesmo. Tanto quanto me lembro, não insisti durante muito tempo. Quando comecei a ver os meus coleguinhas a embirrar com os irmãos – essa forma de demonstração de amor que realmente desconheço – comecei a ver as vantagens de ser filha única.
Sempre gostei de sossego, sempre fui uma criança calma ao ponto de nem dar a volta quando ainda estava na barriga da minha mãe; estava sentada e deixei-me estar…
Sempre vivi num ambiente de plena paz, de total respeito pelo espaço dos outros. Tanto a minha mãe respeitava o meu espaço, também filha única descendente de filha única, como exigia que eu respeitasse o dela (se bem que, no que respeita a bisbilhotar os cantos da casa, não tivesse sorte nenhuma!).
Mas nunca me senti só.
Onze meses depois de mim nasceu a minha irmã mais nova. Filha única, filha do filho único que sabia que eu iria esperar pelos anos dele para nascer.
A minha irmã mais nova era pequenina (na verdade eu é que era grande, mas estou a expôr o meu ponto de vista). Era pequenina, frágil, desconfiada e muito mais resmungona que eu. Não gostava de bigodes e recusava-se a dar beijinhos a quem quer que fosse que os tivesse. Lembro os seus olhinhos de azeitona sempre alerta, as mãos esguias.
Eu protegia-a e ela sabia.
A minha menina com mãos de fada morava num castelo com torre e tudo.
Passávamos o tempo todo juntas e cheguei a morar em casa dela quando aminha mãe partiu o pé e não conseguia subir ao nosso segundo andar. Desenvolvi a técnica de não ter cócegas nos pés para os nossos pais acreditarem que eu tinha adormecido e ficar lá a passar a noite.
A minha irmã mais nova adorava enchidos como eu adorava doces. Nas ferias assaltávamos os armários e ela enchia-se de chouriço enquanto eu acabava com as bolachas. Nunca mais conheci ninguém que gostasse tanto de chouriço!
Quando saíamos da escola lanchávamos em casa da avó dela. A Maria fazia uma massa frita inesquecível.Cantávamos muito, mesmo porque ela lembrava-se sempre das músicas todas por mais que o tempo passasse.
O tempo passou e eu mudei de escola. “Agora vais para a Escola e nunca mais vamos estar assim juntas”, disse. Acho que foi a última vez que lanchei em casa da avó dela.
A vida afastou-nos como afasta os irmãos. Como sempre vivi longe da minha outra irmã, outra filha única, da minha idade, tipo irmã gémea “sempre com o cabelo igual”.
Por mais longe que estejam os irmãos sê-lo-ão sempre.
Ainda hoje me preocupo com a minha irmã mais nova e tenho pena de já não ser suficientemente grande para a proteger.
sexta-feira, março 03, 2006
As filhas únicas também têm irmãs
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6 comentários:
Eu não sou filha única. E a vida não nos afastou (pelo contrário!).
Ainda assim espero preencher os requisitos para me teres como uma irmã. Como eu te tenho. Irmã de coração.
Minha adorada ladybug, já és minha afilhada, vais ser madrinha também, tens uma irmã...não sejas garganeira, deixa um bocadinho para os outros! ;)
Olha, olha... faço uma declaração de amor tão linda e sou tratada desta maneira!!
Garganeira... eu??
Muitos beijos para ti! Shuac! (ciumenta, preferes?!)
Sim. Prefiro. Não é agradável, mas é verdade. Paciência.
Muito obrigada, estou a babar e a babar e a babar glup glup glup, ainda bem que também fomos juntas à natação ou acho que me afogava agora mesmo ;)
És um doce
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