terça-feira, fevereiro 21, 2006

Caneta e Pincel


relógio d'agua, 1999

a propósito das diferenças culturais num mundo global
excerto de "O Elogio da Sombra" de Junichiro Tanizaki, 1933*

Vejamos um exemplo muito simples. Publiquei recentemente na "Bunguei-shunjû", um artigo no qual estabelecia a comparação entre a caneta e o pincel; pois bem, supondo que o inventor da caneta tivesse sido um japonês ou um chinês de antigamente, é por demais evidente que não a teria munido de modo algum de um aparo metálico, mas sim de um pincel. E teria sido, não uma tinta azul, mas qualquer líquido análogo à tinta-da-china que ele se esforçaria por conseguir fazer descer do reservatório até aos pêlos do pincel. Como consequência, visto os papéis de tipo ocidental não convirem à utilização do pincel, teria sido necessário, para dar resposta a uma procura acrescida, produzir em quantidades industriais um papel análogo ao papel japonês, uma espécie de "hanshi" melhorado. E se o papel, a tinta-da-china e o pincel se tivessem desenvolvido nesta direcção, a caneta e a tinta ocidental nunca teriam conhecido a sua aceitação actual, os adeptos dos caracteres latinos não teriam nunca tido audiência, e os idogramas e os "kana" teriam sido objecto de uma predilecção unânime e poderosa. E não é tudo: a nossa própria maneira de pensar e mesmo a nossa literatura não teriam imitado de forma tão servil o Ocidente e, quem sabe?, talvez tivéssemos caminhado em direcção a um mundo completamente original. Através destas reflexões, quis mostrar que a própria forma de um instrumento de aparência insignificante podia ter repercussões quase até ao infinito."

*não, não me enganei a escrever a data!

3 comentários:

Ladybug disse...

Então, agora dás pulinhos ao futuro para escrever?

Ladybug disse...

Snif... Snif...
[Não me respondes... :( ]

mir disse...

Não foi escrito no futuro. È aquele pormenor de ser escrito depois da meia-noite, logo, no dia seguinte!